Nunca celebrei o Dia das Mães, não importa em qual país esteja vivendo. Sempre considerei uma convenção superficial criada apenas para acalmar as mulheres e fingir que seu trabalho é valorizado. Sei que as origens do Dia das Mães remontam à possível apropriação cristã de uma celebração romana, possivelmente desenvolvida para homenagear a Virgem Maria. No entanto, vamos encarar a realidade: a tradição posterior de permitir que os empregados voltem à “igreja de suas mães” por um único dia por ano não é uma verdadeira celebração da maternidade. É uma concessão patriarcal-capitalista com pouco valor intrínseco. Não reconhece adequadamente o trabalho das mulheres, tanto remunerado quanto não remunerado, nem as graves consequências frequentemente associadas ao parto.
O Dia das Mães, em sua forma atual, é apenas mais uma ferramenta capitalista-patriarcal para iludir as mulheres, fazendo-as acreditar que seu trabalho é valorizado. Infelizmente, o trabalho das mulheres nunca foi verdadeiramente valorizado. Ainda somos sobrecarregadas com a maior parte dos cuidados com os filhos e das tarefas domésticas, além de nossos empregos remunerados. As mulheres também desempenham um papel fundamental no trabalho voluntário, administrando centros comunitários, grupos de recreação e atividades infantis. São as mulheres que se voluntariam para acompanhar as excursões escolares ao zoológico, que realizam o trabalho não reconhecido responsável pelas vitórias das campanhas políticas.
Receber um cartão e algumas flores um dia por ano está longe de ser uma compensação adequada pelo nosso trabalho, supondo que tenhamos esse dia. Afinal, a maioria de nós é mãe e filha, então a quem pertence esse dia? É realmente um “dia das mães” quando passamos o dia inteiro limpando a casa e cozinhando para a sogra? É realmente o nosso dia quando ainda precisamos fazer compras no supermercado e planejar o cardápio da semana? Quantas mulheres têm um dia inteiro de folga, sem responsabilidades em relação a ninguém? Quando os parceiros assumem as tarefas sem esperar elogios por lembrarem-se de escovar os dentes das crianças ou levá-las ao parque por uma hora?
O que mais me incomoda no “Dia das Mães” é a hipocrisia que o cerca: “Uma mãe é uma pessoa que, quando há apenas quatro pedaços de torta para cinco pessoas, prontamente anuncia que não gosta de torta”. Ser mãe não deveria se resumir a abrir mão de tudo o que nos torna humanas, apenas para garantir que ninguém fique sem um pedaço de torta. Eu gosto de torta. E, sinceramente, se um adulto não consegue encontrar uma maneira justa de dividir esses quatro pedaços, ele deveria ser o único a perder o seu pedaço. Eu não abro mão do meu.
Ser mãe vai muito além de sacrifícios, e precisamos reivindicar isso adequadamente, em vez de deixar que datas comemorativas façam isso por nós. Não quero receber flores que murcham em uma semana ou chocolates que tenho que compartilhar com todos os outros, apenas para não ser vista como egoísta. Não gosto de ser tratada com condescendência e enganada com gestos superficiais. O que eu quero é que a maternidade, em todas as suas formas, seja reconhecida e protegida. Quero que a saúde materna seja considerada uma questão de saúde pública prioritária. Quero que as mulheres que sofrem de depressão pós-parto tenham acesso a um suporte adequado. Quero uma legislação real que proteja e garanta uma licença-maternidade adequada. Quero que as creches sejam universais e gratuitas. Quero que as escolas recebam financiamento adequado, para que eu não precise passar meus fins de semana arrecadando fundos para comprar materiais escolares. Quero acesso universal a métodos contraceptivos e ao direito de fazer escolhas sobre o meu próprio corpo. Quero que a infertilidade e os abortos espontâneos sejam tratados com respeito e compreensão. Quero que as mulheres que optam por não serem mães, ou que não podem ter filhos, sejam respeitadas em sua escolha. Quero um sistema de saúde que cuide adequadamente dos idosos, dos deficientes e dos membros mais vulneráveis da família.
Quero que os pais assumam a responsabilidade emocional e financeira pelos seus filhos. Quero que os homens que se recusam a pagar pensão alimentícia sejam punidos. Quero que os homens abusivos sejam proibidos de prejudicar suas ex-parceiras enquanto fingem ter “direitos” sobre seus filhos. Quero que os homens que cometem violência doméstica sejam responsabilizados por suas ações. Não acredito que um homem que seja violento com sua parceira possa ser um bom pai. Se você não consegue tratar sua parceira com respeito, não confio que fará o mesmo com seus filhos. Quero que os homens assumam metade da responsabilidade no cuidado com os filhos e nas tarefas domésticas. Até que isso aconteça, não acredito que devam ter direito à guarda compartilhada. Se você quer a guarda compartilhada, prove que é capaz antes que seu relacionamento chegue ao fim.
Quero que a violência sexual e o estupro sejam processados com todo o rigor da lei. Quero o fim da prostituição e do tráfico de seres humanos, criminalizando aqueles que compram o corpo das mulheres. Quero o fim da pornografia que explora e objetifica as mulheres. Quero que os homens que lucram com a exploração sexual e a tortura das mulheres sejam processados e que seus bens sejam confiscados para financiar centros de apoio às vítimas de estupro e serviços de combate à violência doméstica. Quero que minhas filhas cresçam sem jamais sofrerem assédio sexual. Nas palavras de Andrea Dworkin, eu quero um dia de trégua, um dia de folga, um dia onde novos corpos não serão empilhados, um dia onde não haja novas agonias acrescentadas às antigas, e eu estou pedindo que vocês me deem isso. E como eu poderia pedir menos? É tão pouco. E como vocês poderiam me oferecer menos: é tão pouco. Mesmo nas guerras, há dias de trégua. Vão e organizem as tréguas. Parem o lado de vocês por um dia. Eu quero uma trégua de vinte e quatro horas sem estupro.
Para o próximo ano, não quero uma caixa de chocolates ou algumas flores. Quero o fim da hipocrisia patriarcal. Quero que todas as mulheres tenham a chance de serem saudáveis e felizes todos os dias. Não em um mísero e patético dia por ano.
Tradução e adaptação do texto original de Louise Pennington pro Washington Post.